Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a saúde pública passou a ser um direito de todos e dever do Estado, porém, como é de fato notório que o Poder Público não consegue viabilizar a saúde em todo território nacional, abriu-se um nicho de mercado para operadoras de planos de assistência à saúde.

Desta forma, foi criada a Agência Nacional de Saúde (ANS), sendo uma autarquia que versa sobre as matérias que dizem respeito à saúde suplementar, orientando as pessoas jurídicas de direito privado que operam planos de assistência à saúde, através da lei 9656 de 1998.

Com essa regulamentação, a ANS estabelece uma lista, um rol de procedimentos que devem ser cobertos pelos planos de saúde, referente a tratamento, medicamento e procedimentos, ou seja, incorporação de novas tecnologias em saúde regulamentada pela RN nº 439/2018. É estabelecido uma listagem de procedimentos considerados indispensáveis.

O primeiro Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde estabelecido pela ANS foi o definido pela Resolução de Conselho de Saúde Suplementar – CONSU 10/1998, sendo posteriormente atualizado, em média, de 2 em 2 anos.

Desta forma, além do direito ser extremamente dinâmico, a ciência e a saúde não são diferentes. A todo momento diversos medicamentos ou tratamentos são descobertos que trazem um benefício a dois direitos elementares no direito: Direito à vida e à Dignidade da Pessoa Humana.

O Direito à Vida está diretamente ligado ao rol de procedimentos, já que novas tecnologias de saúde são descobertas a todo momento, trazendo mais eficácia para a saúde e preservação da vida.

Ao passo que a Dignidade da Pessoa Humana está relacionada ao benefício que a nova tecnologia, do melhor tratamento que a pessoa pode ter, evitando sofrimento com a doença ou seu estado de saúde.

Por entender que a atualização do rol de procedimento obrigatório não está em constante atualização, ou seja, como a mencionada atualização de 2 em 2 anos, o entendimento jurisprudencial se firmou, ao longo dos anos, que seria um Rol exemplificativo.

No rol exemplificativo (entendimento majoritário atualmente), aos que entendem assim, temos apenas uma listagem de exemplo, porém ficando a critério do médico o uso de algo que seja preconizado pela medicina ou autorizado pela ANVISA, ou seja, caso não tenha no rol e cumpra os critérios, deverá ser coberto pela operadora de saúde em benefício do usuário.

“O fato de o procedimento não constar no rol da ANS não significa que não possa ser exigido pelo usuário, uma vez que se trata de rol exemplificativo” (AgInt no AREsp nº. 1.442.296/SP, julgado em 23/3/2020).

Por outro lado, no rol taxativo (entendimento que vem ganhando força no STJ) entende-se que a operadora do plano de saúde deve cobrir apenas o que se encontra listado, não sendo obrigação da operadora do plano de saúde custear tratamento ou procedimentos que não estejam englobados na lista pré-estabelecida.

“Em dezembro de 2019, em decisão marcante, ao julgar o REsp nº 1.733.013/PR, a Quarta Turma do STJ decidiu (com entendimento de overruling), por unanimidade, no sentido oposto: a lista não seria meramente exemplificativa, mas taxativa, de modo que os procedimentos nela não previstos estariam, em princípio, fora da cobertura assistencial obrigatória.”[1]

A corrente jurídica que defende o rol ser exemplificativo versa sobre a missão impossível de se ter um rol de procedimento atualizados em tempo real, justamente por ser a média para a atualização a cada 2 anos, não sendo justo ao usuário, ora consumidor, que aguarde a atualização sem previsão para acontecer.

Já a segunda corrente, que entende quanto ao rol taxativo, busca apresentar critérios financeiros e o princípio do pacta sunt servada, por se tratar de direito privado, a força obrigatória dos contratos deve ser respeitada, além do grande prejuízo financeiro que pode acarretar com as diversas autorizações fora da lista de procedimento da ANS.

Destaque deve ser feito para a pandemia do COVID-19, visto que o rol da ANS acabou sendo atualizado 3 vezes em um curto período de tempo, incluindo nas coberturas obrigatórias, testes diagnósticos para a Covid-19 (RN nº 453, de 12 de março de 2020, RN nº 457, de 28 de maio de 2020 e RN nº 460, de 13 de agosto de 2020).

Esta recente atualização se mostrou necessária justamente por não acompanhar a necessidade de seus usuários em tempo real e por entender que deveria ser obrigatório a cobertura rapidamente de tais procedimentos, já que aumentou a judicialização neste sentido.

“A natureza do rol de procedimentos da ANS está no cerne da hiperjudicialização da saúde suplementar experimentada no Brasil. São milhões de processos em tramitação para discutir a obrigatoriedade de cobertura de determinados tratamentos ou medicamentos não previstos pela autarquia. A depender do resultado, a recusa é considerada abusiva e pode gerar indenização.”[2]

Com a divergência jurisprudencial entre a 3ª e a 4ª turma, diversas súmulas, em especial de São Paulo e Rio de Janeiro, começaram a ser afastadas, por estabelecerem que havendo indicação médica, a negativa de cobertura pela operadora do plano de saúde seria abusiva.

Desta forma, pela insegurança jurídica, o colegiado composto pelos dez ministros da 3ª e 4ª Turmas, as que julgam matéria de direito privado, irão julgar um primeiro caso sobre o tema no Recurso Especial 1.867.027, não havendo data para julgamento.

Portanto, coloca-se lado a lado a saúde dos beneficiários e a lucratividade das operadoras de plano de saúde. Ter o rol taxativo ou exemplificativo deve ter como critério diversos aspectos que viabilizem tanto a saúde/vida do usuário como a viabilidade do negócio para os planos de saúde, visto que os planos projetam os valores de acordo com a apresentação do rol e, a partir do momento que colocam procedimentos não previstos, alegam ter enormes prejuízos.

A necessidade de ter uma definição sobre o tema se mostra urgente. A insegurança jurídica que já é algo recorrente dentro do Judiciário brasileiro, em relação a um tema como a vida tão importante, deve ter rápida solução para todos.


Foto do CANVA
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[1] https://www.conjur.com.br/2020-set-26/opiniao-planos-saude-rol-ans-quem-pagar-conta

[2] https://www.conjur.com.br/2021-fev-26/antes-stj-julgar-ans-define-rol-tratamentos-taxativo

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